segunda-feira, 20 de julho de 2015

CADA censura falta de respostas da Câmara de Sintra sobre esplanada ilegal



A Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) determinou que a Câmara de Sintra deve facultar ao autor do Tudo sobre Sintra todos os documentos solicitados no âmbito do embargo da esplanada do Hotel Central Palace, no centro histórico, excepto um eventual auto de contra-ordenação, caso este ainda se encontre em curso, ou justificar por escrito eventuais recusas totais ou parciais.

“A entidade requerida deverá facultar o acesso aos documentos que contenham as informações solicitadas e que ainda não tenham sido disponibilizados”, lê-se no parecer da CADA, datado de 14 de Julho, que surge na sequência de uma queixa apresentada a 19 de Janeiro contra a Câmara de Sintra, devido à violação reiterada da Lei de Acesso a Documentos Administrativos (LADA).

Em causa, a ausência de resposta a vários pedidos de informação com questões como se a obra contou com autorização e licenciamento por parte da câmara; se foi emitido algum parecer técnico que fundamentasse um eventual licenciamento e qual o conteúdo desse parecer (pedido enviado a 22/12), bem como aos pedidos de acesso ao “despacho de embargo da obra, de 29/12, e a eventual documentação administrativa emitida posteriormente” (pedido enviado a 5/01)

Por responder estavam igualmente (e ainda estão) questões como se em Janeiro a esplanada já tinha sido legalizada e quais os contornos desse licenciamento; sobre se a autarquia tinha conhecimento de um alegado prosseguimento das obras; e sobre se algum serviço municipal levantou novo auto de contra-ordenação e qual o conteúdo desse documento (terceiro pedido, enviado a 14/01).

Além de questionar a legitimidade dos pedidos (ver comentário), a Câmara de Sintra alega que a queixa está “parcialmente esvaziada de objecto”, porque a 23 de Fevereiro (após o envio da queixa), o adjunto da presidência remeteu ao requerente “o despacho de embargo” e por considerar que “tudo o mais são questões que se reportam à prestação de informações de índole geral, admite-se que com interesse em sede de investigação jornalística e não a documentos precisos concretamente identificáveis”.

No entanto, ao contrário do alegado pela autarquia, este pedido não “foi satisfeito”. A única resposta da Câmara de Sintra, que surge apenas após a denúncia de que a câmara não respondera a dois terços dos pedidos de informação do Tudo sobre Sintra, traduz-se num “mandado de embargo” (ver documento) que, como facilmente se constatará, não é o “despacho de 29/12”, dado que esse documento é referido como um anexo, mas nunca foi disponibilizado (embora tenha sido facultado à agência Lusa, que o cita aqui).

A autarquia vai mais longe para justificar a ausência de mais respostas, alegando que “salvo melhor entendimento, a Câmara de Sintra não tem de elaborar documentos ‘ex-novo’ que vão no sentido de concretizar as questões, nem o presidente da câmara tem qualquer obrigação de se pronunciar quanto às questões” colocadas. A CADA, por seu lado, esclarece o município que, caso existam, deve facultar eventuais autorizações, licenças ou o conteúdo de um parecer técnico, bem como “comunicar por escrito as razões da recusa, total ou parcial”, o que nunca aconteceu.

No caso de um eventual segundo auto de contra-ordenação (o único solicitado a 14/01), a autarquia parece confirmar a sua existência, dado que alega à CADA que o mesmo não pode ser disponibilizado por estar abrangido pelo segredo de justiça, o que é aceite pela CADA, mas apenas enquanto decorrer o processo. Após este período, esta entidade esclarece que os documentos passam a estar abrangidos pela LADA. [ver parecer da CADA]

Luís Galrão/Tudo sobre Sintra


Comentário

Na resposta à CADA (reproduzida apenas parcialmente no parecer), a Câmara de Sintra começa por colocar em causa a legitimidade do requerente, alegando que o mesmo não pode alegar a qualidade de jornalista. Acontece, como a própria CADA esclarece, que essa condição nunca foi invocada, dado que o autor do pedido limita-se a informar que está registado na Comissão da Carteira Profissional de Jornalista como “colaborador” do Jornal de Sintra.

Curiosamente, este título de “colaborador”, mais simples que o de jornalista, existe precisamente “para fins de acesso à informação” por parte de “colaboradores da área informativa de órgãos de comunicação social regionais ou locais, que exerçam regularmente actividade jornalística sem que esta constitua a sua ocupação principal, permanente e remunerada”, como é o caso.

De qualquer forma, convinha que a Câmara de Sintra tivesse presente que, como explica a CADA, “os documentos respeitantes a procedimentos urbanísticos são, em princípio, não nominativos, de acesso generalizado e livre”, pelo que “todos podem aceder aos mesmos sem necessidade de invocar qualquer interesse ou de apresentar qualquer justificação ou fundamentação”.

Na argumentação enviada à CADA, a autarquia alega ainda que “a invocação da categoria de gestor de um blogue informativo (…) em nada adianta caso o mesmo não seja legalmente considerado um órgão de comunicação social”, pelo que os pedidos enviados pelo Tudo sobre Sintra serão somente considerados como “queixas do cidadão e munícipe” que os subscreve.

Além de menosprezar o papel do Tudo sobre Sintra nos últimos cinco anos, a autarquia parece desconhecer que, à luz do actual quadro legal, é facultativo o registo deste tipo de blogues informativos junto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC). Aliás, consultada esta entidade em 2011, foi seu entendimento que o Tudo sobre Sintra não necessitava de proceder a esse registo.

Apesar disso, a convite da ERC, o Tudo sobre Sintra tem vindo precisamente a colaborar com a entidade reguladora no âmbito da elaboração de um novo enquadramento legal para os novos media, tendo, inclusive, participado no último encontro anual desta entidade. Lamentavelmente, num município que propala valores como a transparência, a comunicação e a informação, há quem ainda viva no milénio passado.

Luís Galrão


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1 comentário:

  1. É lamentável esta postura camarária, oponível ao sentido de transparência que nos tem sido transmitido desde a campanha eleitoral que alterou o quadro do Executivo até às últimas intervenções públicas conhecidas.

    Devemos ou não ter confiança nestes gestores públicos, eleitos para decidirem em conformidade com o respeito que a causa pública deve merecer, sendo relevante a transparência?

    Aquela esplanada, o seu início, a sua denúncia e aquilo que começa a configurar-se como incapacidade de uma decisão, pode levar-nos a meditar que, quantas vezes, certos apoios se tornam verdadeiras verrugas na independência.

    Julgava Sintra já livre disto. Pode ser que sim.

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